domingo, 30 de janeiro de 2011

Depoimentos

jorge paulino

Olá amigos.

Sou Jorge Paulino (de Moçambique, talvez o 1o Moçambicano a se juntar ao Fórum).
Sou buscador da verdade e me parece que eu e vocês temos coisas em comum: “Vontade de libertar as pessoas da escravidão da cegueira mental criada pela STV.” Felizmente, graças a pessoas como vocês (que partilham a informação com quem quer que a desejar), consegui me libertar da cegueira que me apoquentava há anos. Sem essas pessoas, não sei que rumo minha vida teria.

Minha história como TJ (Resumo)

Quando eu ainda era bem novo (talvez aos 9 anitos), minha mãe converteu-se a TJ. E como era de se esperar eu também tinha de seguir o mesmo rumo. Aos 14 ou 15 anos me tornei “publicador não baptizado”, aos 16 me baptizei. Aos 26 me tornei Servo Ministerial. Mas uma coisa confesso: nunca gostei de ser TJ. Sempre tive minhas dúvidas e questões que me levavam a crer que aquela religião não tinha bases para se auto intitular de verdadeira, o pior, a única verdadeira. Minha vida sempre foi uma batalha nos murros da organização. Eu quase funcionava como um robô comandado pelos meus pais: me tornei publicador, porque eles queriam; me baptizei, porque eles queriam; tentava ser zeloso, porque eles queriam. Em fim, tudo (ou boa parte do que fazia) era para agradar a eles. Quando cresci, cresceu também o número de pessoas a quem tinha de agradar: os meus amigos TJs, os “irmãos” que tanto me admiravam. Chegou uma altura que eu sentia que estava a suportar a alegria de muitos.

A desilusão

Nos finais de 2007 comecei a pesquisar sobre as Testemunhas de Jeová (na net, claro) e não demorou para as minhas dúvidas ficarem esclarecidas: Afinal de facto estava a ser enganado! Li o “Crise” e no final a desilusão se apoderou de mim. O que teria de fazer então? Abandonar tudo? Acho que não! Que impactos teria em mim essa mudança brusca? Não! Não devia abandonar, afinal ainda não me identificava com a nova realidade. As bases para refutar tudo o que aprendi durante mais de 15 anos ainda não as possuía. Mas será que o que acabava de descobrir era verdade? Bom, eu me dei tempo de fazer uma análise independente. Comecei por ler a bíblia da ponta-para-ponta, duas vezes em menos de 9 meses. O objectivo era encontrar algo que provasse que de facto fui iludido. Da minha leitura da bíblia + aquilo que eu lia em blogues de pessoas comprometidas com a verdade, formei as minhas próprias bases para me virar contra a organização, alias, para me livrar dela.

Nos princípios de 2008 eu já estava +/- claro e estava a estudar a melhor maneira de eu largar tudo. Mas eu não podia simplesmente abandonar, senão seria confundido com tantos outros que abandonam a organização por “motivos fúteis”. Eu queria deixar muita curiosidade (nos irmãos) com a minha saída. Felizmente nesse período fui nomeado como “Servo ministerial” e estava nas minhas mãos todo o material para impressionar as pessoas para depois dar o “golpe”. Dito e feito. Aproveitei-me do meu novo cargo para impressionar todo o mundo: com os discursos (que na maioria das vezes se confundiam com discursos de superintendentes viajantes), comentários muito construtivos (mesmo sabendo que a maioria do que eu comentava era mentira), zelo no campo, sorrisos aqui e sorrisos ali. Ao fim de um ano eu já era considerado o pilar da congregação. E a admiração que as pessoas tinham por mim era notável. Prontos, o solo já estava fértil. Mas e depois? Bom, depois tinha de abandonar tudo! Sim, mas e depois? Depois muitos iriam questionar os “porquês” de eu ter abandonado a organização. Afinal eu era muito zeloso e não tinha “mancha do mundo”. Sim, mas, e depois? Afinal depois de abandonar ninguém mais iria querer saber de mim. Logo, não teria como fazer entender a multidão dos meus amigos os motivos que fizeram com que eu me afastasse do “caminho da vida”. É verdade! Mas, e se eu fizesse um livro?! Talvez ele poderia falar por mim mesmo depois de eu ter abandonado. Isso fazia sentido! Então me dei tempo de documentar os motivos do meu afastamento. Nos princípios deste ano (2009) me empenhei em fazer esse documento o qual decidi intitular: “Por que deixei de ser membro da ‘única’ religião ‘verdadeira’”. Em Agosto a obra já estava pronta e eu já tinha o passaporte para me livrar da STV. No dia 2 de Setembro enviei uma carta ao superintendente presidente pedindo uma reunião com todos os ancião. No dia 6 de Setembro houve a tal reunião e eu me despedi deles. E lhes informei que os motivos da minha dissidência estavam documentados no livro que com eles deixei. E prontos! Foi bastante chocante para eles. E no dia 11 de Setembro viria a ser triste para toda a congregação pois foi nesta data que a minha dissociação (a primeira na minha congregação) foi anunciada. No final da reunião foram seleccionados alguns irmãos e foram severamente instruídos a não ler o meu livro, e para os que já o possuiam, o conselho foi de eles queimá-lo. Já havia entregado o livro a alguns amigos meus e ninguém se interessou em queimá-lo e acredito que pessoas inteligentes ficarão mais curiosas e procurarão o livro. No dia seguinte mandei uma mensagem (aos anciãos)com este texto: “Por favor não queimem o meu livro. Lembrem-se de que a verdade não teme a mentira”. E de certeza eles ficaram “sem boca”; nem me responderam. Tenho esperança de que o livro vai livrar muitos dos grilhões da STV. Os que já folhearam o livro disseram-me o conteúdo faz muito sentido.

Mito do "Escravo Fiel e Discreto"

B. J. Kotwall


Estes versículos da parábola de Jesus são usados pela Sociedade Torre de Vigia com mais freqüência do que quaisquer outros, para manter um controlo apertado sobre as Testemunhas de Jeová:

"Quem é realmente o escravo fiel e discreto a quem o seu amo designou sobre os seus domésticos, para dar-lhes o seu alimento no tempo apropriado? Feliz aquele escravo, se o seu amo, ao chegar, o achar fazendo assim! Deveras, eu vos digo: Ele o designará sobre todos os seus bens." (Mateus 24:45-47)

É nossa intenção mostrar neste artigo que a Sociedade Torre de Vigia tem usado estes versículos da parábola para extrair deles um sentido profético incorreto e completamente injustificado. (A Sentinela, 1.º de setembro de 1981, p. 24; The Watchtower, 15 de julho de 1960, p. 462; Aproximou-se o Reino de Deus de Mil Anos, 1975, p. 350)
O "Escravo" era todo o corpo de Cristo

Até 1895, a Sociedade Torre de Vigia ensinou que o "Escravo" era todo o corpo de Cristo. (Zion's Watch Tower, novembro de 1881, p. 291; janeiro de 1890, p. 1171; 1.º de abril de 1895, p. 1797).
Russell era o "Escravo"!

Mas em breve, em 1896, eles mudaram de idéias e um indivíduo, Charles T. Russell, foi escolhido como "Escravo". Acontecia que Russell também era quem mandava na Sociedade Torre de Vigia.

Comentadores bíblicos, fora da Sociedade Torre de Vigia, entendem esta passagem como uma parábola, que Jesus deu para encorajar cada um dos seus seguidores individuais a ser um servo fiel e sábio, em vez de um escravo mau. Jesus não estava dando aqui uma profecia como a Sociedade Torre de Vigia defende. Em apoio disso, Jesus continuou, dizendo nos versículos seguintes:

48 "Mas, se é que aquele escravo mau disser no seu coração: 'Meu amo demora', 49 e principiar a espancar os seus co-escravos, e a comer e beber com os beberrões inveterados, 50 o amo daquele escravo virá num dia em que não espera e numa hora que não sabe, 51 e o punirá com a maior severidade e lhe determinará a sua parte com os hipócritas. Ali é onde haverá o [seu] choro e o ranger de [seus] dentes." (Mateus 24:48-51)

Porém, Russell converteu esta admoestação numa designação pessoal dele próprio como o "Escravo Fiel e Sábio" -- o porta-voz de Deus para a Humanidade! Entre 1896 e 1927, a Sociedade Torre de Vigia ensinou que Russell era aquele Servo (ou Escravo). (Zion's Watch Tower, 1.º de março de 1896, p. 1946; Studies in the Scriptures, vol. 1, edições de 1924-1927, p. 7; vol. 4, p. 613; vol. 7, p. 3, 5, 418, 422; The Watch Tower, 1.º de março de 1917, p. 6049; Harp of God, 1921, p. 229).
Russell não era o "Escravo"!

Rutherford, o segundo presidente da Sociedade Torre de Vigia, mudou essa crença em 1927 e afirmou que a designação do escravo aplicava-se, não a um indivíduo -- Russell -- mas sim à organização Sociedade Torre de Vigia. Foi também publicitado falsamente que Russell nunca afirmara ser esse "Escravo" (The Watch Tower, 15 de fevereiro de 1927, p. 56; Aproximou-se o Reino de Deus de Mil Anos, 1975, p. 346). No entanto, como os críticos expuseram esta mentira da Sociedade Torre de Vigia, eles fizeram uma admissão parcial no seu último livro de história, Testemunhas de Jeová -- Proclamadores do Reino de Deus (1993), dizendo: "O conceito que ela [a esposa de Russell] expressara sobre a identidade do 'servo fiel' chegou a ser sustentado de modo geral pelos Estudantes da Bíblia por uns 30 anos." (p. 143) O livro na mesma página também lança as culpas sobre a esposa de Russell, Maria, por ter ensinado que Russell era aquele "Servo". Os escritores do livro Proclamadores estão a fingir que desconhecem a Watch Tower de 1.º de março de 1917, p. 6049, que diz muito claramente que "a Watch Tower [Torre de Vigia] proclama sem hesitações o irmão Russell como 'aquele servo fiel e sábio'".
O "Escravo" tem mais de 1800 anos de idade!

A Sociedade Torre de Vigia também ensina, sem qualquer apoio, que o "Escravo" representa a congregação cristã desde o seu começo em 33 A.D. até agora:

"As Testemunhas de Jeová crêem que esta parábola se refere à única congregação verdadeira dos seguidores ungidos de Jesus Cristo. A partir de Pentecostes de 33 E.C. e continuando durante os 19 séculos desde então, esta congregação semelhante a um escravo tem alimentado espiritualmente os seus membros, fazendo isso com fidelidade e discrição." (A Sentinela, 1.º de setembro de 1981, p. 24)

E ainda:

"Desde Pentecostes de 33 A.D., até esta hora presente, esta ("alimentação") tem sido realizada amorosa e cuidadosamente. Sim, e estes "domésticos" têm sido alimentados com comida espiritual progressiva que os mantém a par com a "luz clara que clareia mais e mais até o dia estar firmemente estabelecido."" (The Watch Tower, 15 de julho de 1960, p. 435)

Portanto, a bem nutrida congregação cristã ("Escravo"), como afirma a Sociedade Torre de Vigia, tinha mais de 1800 anos de idade quando Russell apareceu em cena em meados da década de 1870. Esta afirmação é um completo disparate, sem qualquer prova ou justificação. Porque, se era mesmo verdade que havia um "Escravo" operando durante mais de 1800 anos, não teria havido necessidade de Russell "reviver as grandes verdades ensinadas por Jesus e pelos apóstolos" (Jehovah's Witnesses in the Divine Purpose, 1959, p. 17). A Sociedade Torre de Vigia não consegue dizer onde estava essa congregação com 1800 anos de idade! Russell certamente não procurou essa congregação inexistente, nem essa mítica congregação procurou Russell! De fato, Russell nunca se voltou para qualquer organização terrestre. Ele agiu independentemente e por conta própria. Russell e os seus associados eram na realidade contra as organizações terrestres. Russell afirmou que:

"Nós não pertencemos a NENHUMA organização terrestre [...] Todos os santos que vivem agora, ou que viveram durante esta era, pertenceram à ORGANIZAÇÃO DA NOSSA IGREJA; tais são todos UMA Igreja, e não existe NENHUMA OUTRA reconhecida pelo Senhor. Por essa razão, qualquer organização terrestre que interfira de algum modo com esta união de santos é contrária aos ensinos das Escrituras e oposta à vontade do Senhor". (Zion's Watch Tower, fevereiro de 1884, p. 2)

O "Escravo" estava espiritualmente impuro!

Consideremos agora a afirmação da Sociedade Torre de Vigia, de que Cristo voltou invisivelmente em 1914 e em 1919 fez um julgamento no templo que resultou na seleção da Sociedade Torre de Vigia em detrimento de todas as outras igrejas! Jesus realizou isto apesar do fato de saber que a Sociedade Torre de Vigia estava espiritualmente impura nesse mesmo tempo!

"As Escrituras descrevem-nos como tendo vestes impuras devido à sua longa associação com a apostasia cristã [...] Eles tinham muitas práticas, características e crenças similares às seitas da cristandade semelhantes a joio." (The Watchtower, 15 de julho de 1960, pp. 435-436)

O "Escravo" serviu alimento contaminado!

Outro critério para a seleção da Sociedade Torre de Vigia foi este: "A questão era servir alimento, a espécie correta de alimento no tempo apropriado. Tinha de ser sobre isso que o retornado amo precisava fazer uma decisão." (Aproximou-se o Reino de Deus de Mil Anos, 1975, p. 350)

Mas observamos que "a espécie correta de alimento" servido pela Sociedade Torre de Vigia nesse tempo consistia, entre outras coisas, nisto.

O ensino de que o tempo do fim tinha começado em 1799.
Cristo voltou de forma invisível em 1874.
O mundo será destruído em 1914.
As pirâmides são Testemunhas de Deus -- uma "Bíblia" em pedra.
Rutherford tinha começado a pregar nos seus discursos que o mundo acabaria em 1925. Mais tarde, em 1925, ele publicou um livro sobre o mesmo assunto.
Foi publicado em 1917 o livro The Finished Mystery (O Mistério Consumado). O livro continha a matéria mais disparatada que a Sociedade Torre de Vigia alguma vez publicou num único livro.

Pedem-nos que acreditemos que apesar destas aberrações da Sociedade Torre de Vigia nesse tempo, Jesus decidiu escolher a Sociedade Torre de Vigia acima de todas as outras seitas! E é claro que a designação foi confirmada por Jesus e transmitida à Sociedade Torre de Vigia -- tudo invisível também! Quanto à necessidade de a Sociedade Torre de Vigia estar servindo alimento que era claramente superior às outras seitas cristãs [para poder ser escolhida por Jesus], vejam-se as próprias admissões da Sociedade Torre de Vigia, citadas acima, na The Watchtower, 15 de julho de 1960, pp. 435-436 e Aproximou-se o Reino de Deus de Mil Anos, 1975, p. 350.
Mais de 99% dos "Escravos" não fornecem qualquer alimento!

Outro ponto importante é que o "escravo fiel e discreto" supostamente é constituído por todo o restante dos 144.000, que atualmente são 8.661 segundo a última contagem efetuada pela Sociedade Torre de Vigia [A Sentinela, 1.º de janeiro de 2001]. Estes "ungidos" do restante estão espalhados por todo o mundo. É suposto que este "escravo" composto de 8.661 pessoas ungidas partilhe na distribuição de alimento conforme diz a parábola, e como corpo coletivo eles foram TODOS designados sobre os domésticos do amo. (Unidos na Adoração do Único Deus Verdadeiro, 1983, p. 119; Aproximou-se o Reino de Deus de Mil Anos, 1975, pp. 342-343; A Sentinela, 1.º de setembro de 1981, p. 24). É uma charada completa dizer que estes 8.661 "ungidos" do restante, que estão distribuídos à volta do mundo, fazem qualquer tipo de preparação e distribuição do alimento espiritual apresentado às Testemunhas de Jeová pela Sociedade Torre de Vigia. Raymond Franz, ex-membro do Corpo Governante da Sociedade Torre de Vigia, no seu livro In Search of Christian Freedom (Em Busca de Liberdade Cristã, 1991) refere-se a este assunto, dizendo:

"Essa é provavelmente a ficção mais óbvia que podemos encontrar em todo o conjunto de explicações sobre as Escrituras publicadas pela organização. O fato é que nem sequer 1% do número de 'ungidos' tem a mínima parte em determinar o que as Testemunhas de Jeová recebem sob a forma de material bíblico ou na elaboração de políticas ou na direção das atividades dessas pessoas [...] A esmagadora maioria dos artigos publicados na revista A Sentinela foram escritos por pessoas que não pertencem à 'classe ungida'." (p. 154)

Cronologicamente, o "Escravo" não existe!

Outro ponto importante é que a data 1914 para a chegada de Jesus é baseada numa cronologia da Sociedade Torre de Vigia que é inquestionavelmente falsa. A data 607 A.C. para a destruição de Jerusalém, que eles usam como base para os seus cálculos, tem contra si uma quantidade de evidência muito forte e simplesmente não tem qualquer apoio fora da Sociedade Torre de Vigia. O fato de o conceito da identificação do "Escravo" se basear em cálculos cronológicos falsos obviamente demonstra que o "Escravo" não tem "existência" justificada. Carl Olof Jonsson, no seu livro The Gentile Times Reconsidered (Os Tempos dos Gentios Reconsiderados, 1998), recorrendo a argumentos irrefutáveis e muito sólidos, demonstra que é falsa a posição da Sociedade Torre de Vigia quanto à data 1914 e quanto ao mito subsequente do "Escravo".

Em conclusão, gostaríamos de declarar que a história do "escravo fiel e discreto" é uma fábula falsificada feita por homens. Este "Escravo" merece o completo desprezo e rejeição de todas as pessoas racionais.
Resumo

Consideramos várias razões que provam que "o escravo fiel e discreto" é um produto da imaginação da Sociedade Torre de Vigia. Eis um resumo destas razões.

A Sociedade Torre de Vigia nem sequer tem certeza sobre o que deseja publicar sobre a entidade do "Escravo". Até 1896, a Sociedade Torre de Vigia especulou que o "Escravo" era uma organização (o inteiro corpo de Cristo). Entre 1896 e 1927 (11 anos depois da morte de Russell) a Sociedade Torre de Vigia defendeu que o "Escravo" era um indivíduo" -- Russell. Depois de 1927 a Sociedade Torre de Vigia novamente conjeturou que o "Escravo" era uma organização.

A Sociedade Torre de Vigia considerava que o "Escravo" teve uma existência durante cerca de 1800 anos, desde Pentecostes. Não foi apresentada qualquer justificação ou prova para isso -- apenas se afirmou tal coisa. Isto foi, mais uma vez, uma especulação crassa.

Apesar do fato de o "Escravo" estar espiritualmente impuro e estar servindo alimento "contaminado", espera-se que acreditemos que Jesus selecionou a Sociedade Torre de Vigia como "Escravo" dentre todas as outras seitas cristãs. Cristo alegadamente fez isso apesar do fato de a Sociedade Torre de Vigia estar ainda espiritualmente impura e servindo "alimento" contaminado no exato momento em que estava sendo feita a sua designação por Jesus! Tudo isto foi admitido pela Sociedade Torre de Vigia nas suas próprias publicações, conforme foi mostrado acima.

O "Escravo", que supostamente é composto por todo o restante dos 144.000, atualmente totaliza 8.661 pessoas "ungidas", e é suposto que todas colaborem em providenciar "alimento" às Testemunhas de Jeová em todo o mundo. Porém, na realidade, estas pessoas são apenas figuras decorativas e nunca são consultadas em nenhuma das decisões ou anúncios feitos pela Sociedade Torre de Vigia. Todo o conceito do modo como funciona o restante é um fingimento ridículo e manifestamente falso.

Uma cronologia defunta e completamente falsa estabeleceu 1914 como a data da "volta" de Jesus. Como já se provou que essa cronologia é falsa, pode-se afirmar que Jesus não voltou em 1914 e consequentemente não podia ter selecionado a Sociedade Torre de Vigia como o "Escravo" em 1919!

Índice · English

Previsões Fracassadas das Testemunhas de Jeová

"Cristãos maduros também podem se desapontar, e isto tem, em alguns casos, levado à derrocada espiritual. Alguns depositaram sua esperança em uma data, na qual tinham certeza de que o Armagedom viria. Quando nada aconteceu naquele dia, eles sentiram-se decepcionados."

A Sentinela de 15 de Abril de 1990

"Se estas profecias não se cumpriram, e se toda possibilidade de cumprimento já passou, então provou-se que estes profetas são falsos."

Profecia, 1929, pág. 22

"Religiões fundamentalistas muitas vezes procuram tirar da Bíblia o que ela simplesmente não contém: o dia e a hora exatos do fim deste mundo."

A Sentinela de 1.º de abril de 1997, p. 4

Índice

  1. Introdução

  2. Nasce a Escatologia

  3. Russell e a Escatologia

  4. Idéias Adventistas

  5. Apocalipse Adiado

  6. Uma Análise Geral

Introdução

"No entanto, o profeta que presumir falar em meu nome alguma palavra que não lhe mandei falar...., tal profeta terá de morrer." - Deuteronômio 18: 20 (grifo acrescentado)

As palavras acima demonstram bem quão séria era a questão do dom de profecias dentre os do povo de Israel. A penalidade deixava bem claro a qualquer pretenso profeta o que o aguardaria em caso de impostura. É compreensível que fosse assim, pois, o "ofício" de profeta tem uma peculiaridade que o torna particularmente perigoso - as palavras de um suposto profeta são recebidas como oriundas do próprio Deus. Nações inteiras seguiriam cegamente um profeta da mesma forma que os ratos da lenda seguiam o flautista de Hamelin. Inteiramente à mercê das palavras "proféticas", as massas poderiam ser levadas a cometer ou sofrer atrocidades. De fato, a vida de muitos seres humanos poderia estar em jogo. Sob essa perspectiva, é compreensível que a lei mosaica não deixasse alternativa a tal delito, a não ser a morte. Deveras, um falso profeta pode tornar-se assassino de milhões...

Todavia, se por um lado, era grande a responsabilidade que recaía sobre os ombros de um suposto profeta, por outro, grande seria a responsabilidade do povo quanto a dar-lhe ou não ouvidos. O texto alertava:

"E tem de dar-se que o homem que não escutar as minhas palavras que [o profeta] falar em meu nome, deste eu mesmo exigirei uma prestação de contas." - Deuteronômio 18: 19 (grifo acrescentado)

Vemos, portanto, que a questão do profetizar era, naquele tempo, bastante delicada para os dois lados - tanto o anunciante como seus ouvintes corriam sério risco. Muitos supostos profetas foram perseguidos ou até mesmo mortos. Jesus Cristo chamou Jerusalém de "matadora dos profetas e apedrejadora daqueles que lhe [foram] enviados" (Mateus 23: 37). Por outro lado, previu o surgimento de muitos falsos profetas (Marcos 13: 22). Séculos antes dele, homens como Jeremias, Isaías e outros haviam sofrido intensamente na condição de profetas. Em seus dias, Cristo provavelmente viu alguns arvorarem-se em porta-vozes de Deus, causando bastante tumulto entre os judeus. O livro de Atos - cap. 5 e versículos 36 e 37 - menciona, pelo menos, dois destes, Teudas e Judas. Com o advento do cristianismo e a expectativa de "dons do Espírito Santo" (Pentecostes, 33 E.C.) - entre eles, o dom da previsão -, pretensos 'profetas' começaram a surgir de todos os lados. Novamente as pessoas ficavam em um dilema: seguir um falso profeta ou repudiar um verdadeiro. O problema atingiu uma dimensão tal que o apóstolo Paulo enviou advertências às congregações, alertando-as para o perigo de se deixarem levar pela palavra de indivíduos inescrupulosos que interpretavam as Escrituras a seu próprio modo. Em sua segunda carta a Timóteo - cap. 2 e versículos 17 e 18 -, ele menciona dois desses indivíduos: Himeneu e Fileto. Também, em sua carta aos cristãos de Tessalônica, ele os adverte especificamente quanto a ficarem empolgados com "uma expressão inspirada... [ou] uma mensagem verbal" sugerindo a volta do messias (2 Tessalonicenses 2: 1-3). Vemos, assim, que lidar com pretensos profetas ou interpretadores das profecias é um problema que acompanha a congregação cristã desde seus primórdios. Mas, que dizer dos séculos seguintes?

Nasce a Escatologia

Início

A História tem revelado, ao longo das eras, um quadro não muito diferente daquele descrito nos dias do apóstolo Paulo. Já no primeiro século, por meio de rabinos, veio à luz aquilo que convencionou-se chamar escatologia - a interpretação das passagens bíblicas que apontam para eventos cataclísmicos, indicadores da vinda do messias e do restabelecimento do Reino de Israel. Rabinos como Akibah ben Joseph (50-132 EC), Nahawendi, Solomon ben Jeroham, Rashi e diversos outros apontaram como biblicamente significativos os anos de 968, 1260, 1352, 1358 e vários outros. O primeiro dessa lista - ben Joseph - passaria para a história como o promotor do princípio "dia-ano", segundo o qual os "dias" proféticos da Bíblia correspondem, na realidade, a anos literais. Sem saber, o rabino fez escola - sua "fórmula" seria usada séculos à frente, tanto por judeus como por cristãos. Desse modo, o trabalho dos rabinos do primeiro século constitui um importante marco na história da escatologia.

O que se tem observado, desde então, é um processo cíclico - o "alvoroço" profético inflama-se a cada período crítico da história humana, naufraga no fracasso das datas apontadas para os eventos bíblicos e adormece por um tempo. Tão logo o mundo volte a enfrentar turbulências - elas inevitavelmente retornam de tempos em tempos -, a "pirotecnia" profética reacende-se e inicia novo ciclo. Foi assim na época das cruzadas, durante a Revolução Francesa e durante as duas guerras mundiais do século 20. Um aspecto significativo é que as gerações busquem situar os cumprimentos proféticos sempre dentro de sua própria época. Do contrário, que interesse lhes despertariam tais previsões?

Por volta do século 12, autores cristãos partiram de onde os rabinos haviam começado, iniciando nova série de especulações sobre a data para o 'fim dos tempos'. Estudiosos das profecias, como Joaquim de Flora (1130-1202), Arnold de Villanova (1235-1313) e dezenas de outros que se seguiram propuseram novas datas para o cumprimento das profecias de Daniel e Apocalipse, arrebanhando muitos adeptos ansiosos para presenciar os espetaculares eventos. O leitor poderá ter a real noção da quantidade de cálculos escatológicos por examinar o quadro abaixo, no qual acham-se listadas 37 previsões cujos autores viveram do século 12 ao 19. É importante frisar que essas foram feitas segundo uma linha de cálculo comum, retratando apenas uma fração dos prognósticos desse período de 700 anos. Ao examinar cada data, pergunte-se o leitor - qual delas cumpriu de forma clara e incontestável as profecias bíblicas? Todas ou nenhuma?

Autor Data Proposta

Joaquim de Flora

1260
Arnold de Villanova 1364
Walter Brute 1394
Martinho Lutero 1328
A. Osiander 1672
J. Funck 1521
G. Nigrinus 1701
Aretius 1572
John Napier 1576
D. Pareus 1866
J. Tilinghast 1656
A. Artopaeus 1520
Cocceius 1552
T. Beverley 1697
P. Jurieu 1714
R. Fleming 1848 e 2000
W. Whiston 1866
Daubuz 1736
J. P. Petri 1847
Lowman 2013
J. Gill 1866
H. Wood 1880
J. Bicheno 1789
Fraser 1998
G. Bell 1797 e 1813
E. King 1798
Galloway 1849
W. Hales 1880
W. Cuninghame 1792
G.S. Faber 1866
J.H. Frere 1792
L. Way 1791
W.C. Davis 1848
J. Bayford 1789

J. Fry

1797

J.A. Brown

1844

Chamamos a atenção do leitor para o último autor listado acima - John Acquila Brown -, pois ele tem papel fundamental na estrutura doutrinária das Testemunhas de Jeová, muito embora a maioria delas não esteja consciente disso. O nome dele é mencionado na obra Proclamadores, pág.134. O livro afirma que ele relacionara as profecias de Daniel e Lucas - algo que não parece estar de acordo com as provas documentais da época. Seu cálculo apontava para o ano de 1844 e foi aceito pelos seguidores do pastor William Miller, mais tarde chamados de Adventistas. Historicamente, diversos movimentos religiosos originaram-se do Adventismo, entre eles a Igreja Adventista do Sétimo Dia, a Igreja Mundial de Deus e as Testemunhas de Jeová. Há um notável paralelo em sua escatologia. As duas últimas chegaram a apontar uma mesma data para o Armagedom ('fim do mundo') - 1975. À guisa de exemplo, vejamos alguns trechos extraídos de obras dessas três instituições:

"O aumento fenomenal da guerra, do crime, da violência e do medo são todos sinais da Segunda Vinda de Cristo."

Robert Pierson, escritor Adventista do 7o. Dia

"Todos os sinais apontam para o fato de que nós estamos vivendo no 'Tempo do fim' da presente civilização."

Igreja Mundial de Deus, em uma carta a um leitor da revista Plain Truth ("A Pura Verdade")

"Tem havido guerras, escassez de alimentos, terremotos e pestilências ao longo dos séculos da Era Comum até 1914... Todavia, não tem havido nada que se compare com o que tem ocorrido desde... aquele momentoso ano."

A Sentinela de 1/2/1985 (em inglês)

A similaridade das declarações acima faz parecer que elas têm a mesma origem. Embora originem-se de religiões diferentes, partem de um tronco comum - o Adventismo anglo-americano do século 19. Deve o leitor confiar nas informações dessas fontes? Afinal, como distinguir palpite de profecia?

Os antigos israelitas enfrentavam a mesma questão. No entanto, as escrituras hebraicas contêm a resposta. Reportemo-nos ao texto de Deuteronômio, examinado no início deste artigo:

"E caso digas no teu coração: 'Como saberemos qual a palavra que Jeová não falou?', quando o profeta falar em nome de Jeová e a palavra não suceder nem se cumprir, esta é a palavra que Jeová não falou. O profeta proferiu-a presunçosamente. Não deves ficar amedrontado por causa dele." - Deuteronômio 18: 21,22 (grifo acrescentado)

Um exame das previsões anunciadas por Charles Russell e seus sucessores poderá lançar uma luz sobre esse tema, permitindo ao leitor decidir por si mesmo e com base nos fatos em que categoria enquadrar esse movimento religioso.

Russell e a Escatologia

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Charles Taze Russell - o iniciador do movimento hoje conhecido do público como Testemunhas de Jeová - não demonstrava interesse por escatologia no princípio de seu ministério. Seu nascimento se deu cerca de oito anos após o grande desapontamento do movimento Adventista - o fiasco de 1844. De modo que, já na infância, ele ouvira falar deste evento - William Miller, um pastor batista anunciava a volta de Jesus Cristo para aquela data. Milhares apegaram-se a esta esperança e viram seus sonhos se reduzirem a pó. A frustração teve efeito devastador para muitos adeptos do movimento, ocasionando o abandono de boa parte deles, bem como a fragmentação do grupo original em diversos ramos menores - vários deles propondo novas datas. Certamente o conhecimento destes fatos produziram certa medida de ceticismo no jovem Russell. Todavia, anos no futuro ele próprio envolver-se-ia em expectativas semelhantes.

Russell foi criado como Presbiteriano e, mais tarde, afiliou-se à Igreja Congregacional. Porém, por volta dos 16 anos de idade, teve uma crise de fé e abandonou sua religiosidade. Cerca de um ano depois, em 1869, recobrou a fé após assistir a um culto Adventista, em uma sala na rua do comércio dos Russell. Ele criaria seu próprio grupo no ano seguinte. Ele estava ciente de que alguns Adventistas esperavam a 'segunda vinda' de Cristo para 1873 ou 1874, mas, a princípio, não levou esses números a sério. Na verdade, seu encontro com a escatologia se deu dois anos após mais esse fiasco - em 1876. Por volta dessa época, Russell se deixara influenciar pelas idéias de Joseph Seiss, um pastor luterano da Pensilvânia, o qual reacendeu uma antiga teoria: a vinda do Senhor se daria de forma invisível. Casualmente chegou às mãos de Russell uma publicação de um Adventista cuja noção nesse respeito lhe era familiar. Tratava-se de Nelson Barbour - um ex-seguidor do pastor Miller. Ele esperara a vinda do messias para o ano de 1874. Como nada aconteceu naquele ano, ele compensou o desapontamento por reinterpretar o fenômeno da volta de Cristo como um acontecimento invisível aos olhos físicos. Assim, ele passou a divulgar seus achados em um periódico, Herald of the Morning [Arauto da manhã], o mesmo que chegaria às mãos de Russell. A partir e só a partir do encontro com Barbour - em Filadélfia - Russell abraçaria a escatologia como estandarte de seu movimento. Exatamente quais idéias Russell tomaria emprestadas de Barbour? Vejamos.

Idéias Adventistas

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Eis, resumidamente, os cálculos de Barbour, mais tarde adotados por Russell:

  • Números 14: 34 e Ezequiel 4:6 mencionam uma correspondência entre dia e ano.

  • Os 'sete tempos' de Daniel 4: 16, 32 - por essa regra - representam 7 anos ou 2520 dias. Como cada dia equivale a um ano, temos 2520 anos.

  • Os 'Tempos dos Gentios' de Lucas 21: 24 correspondem aos 'sete tempos' de Daniel 4: 16, 32.

  • Os 2520 anos, contados a partir de 606 AC, levam a 1914 DC como o fim dos 'Tempos dos Gentios' e, portanto, a data do início do milênio de Cristo.

  • As "setenta semanas" de Daniel 9: 24 representam 490 dias. Com "um dia por ano", são 490 anos.

  • As 2300 'tardes e manhãs' de Daniel 8: 14, os '1260 dias' de Apocalipse 11: 3, os '1290 dias' de Daniel 12:11 e os '1335 dias' de Daniel 12:12 todos representam anos e correspondem, respectivamente, a 2300 anos, 1260 anos, 1290 anos e 1335 anos.

OBS: para mais detalhes sobre cronologia, consulte http://testemunha.orgfree.com/historia.htm

Antes de qualquer coisa, é preciso que se diga - nenhuma dessas idéias é original. Conforme vimos, o esboço de tais cálculos já vinha se definindo séculos antes de Russell nascer. O cálculo de Nelson Barbour era apenas mais um dentre uma infinidade de projeções possíveis. Inúmeras tentativas foram feitas ao longo dos séculos, partindo de eventos distintos e aplicando períodos "proféticos" distintos. Alguns - inclusive os primitivos Pais da Igreja - interpretaram os "dias " bíblicos como literais, enquanto outros grupos aplicaram o princípio "dia-ano". O resultado: datas e eventos para todos os gostos. A pessoa poderia escolher uma previsão ou rejeitar todas, afinal, tudo era uma questão de fé, ou seja, a crença voluntária em uma idéia que pouco ou nada deve à evidência. Vejamos as principais datas defendidas por Russell e alguns de seus predecessores:

  • 606 AC: a queda de Jerusalém diante do rei babilônico Nabucodonosor; essa data seria mudada para 607 AC.

  • 454 AC: A ordem para reconstruir as muralhas de Jerusalém e o início dos 2300 "dias" da profecia de Daniel 8: 14 e das "setenta semanas" de Daniel 9: 24; essa data seria mudada para 455 AC.

  • 36 DC: O fim das "setenta semanas" de Daniel 9: 24 e o início da pregação cristã aos gentios.

  • 539 DC: Ponto de partida para os 2300 "dias" de Daniel 8: 14, os 1260 "dias" de Apocalipse 13:2, os 1290 "dias" de Daniel 12: 11 e os 1339 "dias" de Daniel 12: 13; corresponde ao começo do domínio papal, no ano seguinte à expulsão dos arianos ostrogodos pelo império romano; a maioria dos Adventistas prefere o ano anterior, ou seja, 538 DC.

  • 1799 DC: o início do 'Tempo do Fim', correspondendo aos 1260 "dias" e marcado pela deposição do Papa por Napoleão Bonaparte (1798 para a maioria dos Adventistas); essa data seria, no futuro, totalmente descartada.

  • 1828 DC: o fim dos 1290 "dias" e o início do movimento Adventista de W. Miller; essa data seria esquecida.

  • 1846 DC: o fim dos 2300 "dias" e a 'purificação do santuário' pela exposição - por parte dos Adventistas - de falsas doutrinas da 'cristandade'; essa data seria igualmente esquecida.

  • 1873 DC: o fim de 6000 anos de existência humana; essa data seria corrigida em 100 anos.

  • 1874 DC: o fim dos 1335 "dias" o início da presença de Cristo e da colheita;no futuro, essa data seria transferida para 1914.

  • 1878 DC: a 'vinda do Senhor' em poder e a ressurreição dos 'escolhidos' que já morreram; essa data seria transferida para 1918.

  • 1881 DC: o fim da chamada geral para o 'pequeno rebanho' de 144.000 santos e a queda de 'Babilônia, a Grande'; essa data seria totalmente descartada.

  • 1914 DC: o fim dos 'Tempos dos Gentios' e da 'Grande Tribulação', culminando com o Armagedom, a purificação da terra e a restauração dos Judeus naturais na Palestina; a data seria mantida, mas os eventos relacionados seriam totalmente modificados.

As datas acima foram obstinadamente defendidas por Russell até sua morte, em 1916. Todavia, o cronograma acima tornou-se totalmente obsoleto. Nenhuma Testemunha de Jeová o defende hoje em dia e boa parte dos adeptos nem ao menos o conhece. Em outras palavras, nem sequer uma dentre as previsões acima materializou-se da forma como o 'pastor' Russell previa.

Há uma dificuldade adicional: uma das datas acima, 606 AC, apontada como marcando a destruição de Jerusalém por Nabucodonosor, não tem qualquer base histórica ou arqueológica. Nenhuma enciclopédia no mundo lhe dá suporte. Nenhum historiador a defende. Todo o peso das evidências coletadas até hoje aponta para cerca de vinte anos mais tarde, ou seja, 586/587 AC.

Apocalipse Adiado

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Mesmo diante do fracasso óbvio das previsões anteriormente descritas, os sucessores de Russell não se deram por vencidos. Todo o cronograma "profético" foi convenientemente reformulado e novas datas foram propostas. O Armagedom fora, por assim dizer, adiado. Por agirem assim, perpetuaram o ciclo anteriormente descrito - previsão, fracasso e nova previsão. Eis as datas seguintes, validadas entre 1917 e 1942:

  • 1914 DC: início do 'Tempo do Fim' e da 'presença' de Jesus Cristo; descartavam-se 1799 e 1874.

  • 1918 DC: início da ressurreição dos 'santos', destruição de 'Babilônia, a Grande', anarquia mundial; descartava-se 1878.

  • 1920 DC: desaparecimento das repúblicas, 'fogo' divino contra a cristandade.

  • 1925 DC: o fim da anarquia mundial, a ressurreição de patriarcas bíblicos e a restauração do Israel natural.

  • 1935 DC: surgimento da 'Grande Multidão', os herdeiros do paraíso terrestre.

  • 1941 DC: restam apenas "meses" antes do Armagedom.

Esse novo cronograma não permaneceria intocado por muitos anos. Novamente, nenhum dos eventos previstos se cumpriu (visivelmente, pelo menos). Das seis datas acima, três não têm mais qualquer significado para as Testemunhas de Jeová: 1920, 1925 e 1941. E outras duas - 1914 e 1918 - enfrentam sérias dificuldades à medida que o tempo passa. Contudo, a criatividade escatológica dos dirigentes da Sociedade Torre de Vigia (entidade jurídica das Testemunhas de Jeová) não parou por aí. A partir da década de 60, o ano de 1975 foi apontado como biblicamente significativo, pois havido sido detectado um erro de 100 anos no cálculo do tempo de existência do homem na terra. O ano de 1874 era, portanto descartado e 1975 ocuparia seu lugar. Mais uma onda de expectativas varreria a comunidade das Testemunhas de Jeová, da mesma forma que já ocorrera em 1914, 1918, 1925 e 1941. E, como das outras vezes, novo desapontamento se abateria sobre elas...

Uma análise Geral

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Bem, façamos um balanço geral da precisão "profética" da Sociedade Torre de Vigia durante sua primeira presidência. Das 12 datas-chave propostas por Russell e tenazmente defendidas por ele:

  • Duas seriam corrigidas: 606 AC e 454 AC.

  • Sete seriam descartadas: 1799 DC, 1828 DC, 1846 DC, 1873 DC, 1874 DC, 1878 DC e 1881 DC.

  • Os eventos associados à mais importante data mantida - 1914 - foram alterados.

  • Nenhum dos eventos previstos se materializou.

Agora, verifiquemos o desempenho das presidências seguintes. Das sete datas-chave propostas:

  • Quatro seriam totalmente descartadas: 1920, 1925, 1941 e 1975.

  • Parte dos eventos previstos para 1918 foram totalmente descartados.

  • As três "sobreviventes" - 1914, 1918 e 1935 - apóiam-se sobre uma cronologia fragílima, a cada dia mais difícil de sustentar, e seus eventos, assim como os de outras datas já descartadas, jamais puderam ser comprovados, a não ser pela "fé", já que alguns deles são "invisíveis".

Os resultados acima são plenamente compatíveis com o método de tentativa e erro. Um exame da história da escatologia, conforme vimos, dificilmente atribuirá às Testemunhas de Jeová um índice de acerto superior às dezenas de outros escatologistas ao longo dos séculos. Elas não acertaram mais do que Akibah ben Joseph, Joaquim de flora, John Acquila Brown ou Nelson Barbour. Distinguir Russell ou qualquer de seus sucessores dentre todos os autores de previsões proféticas dificilmente seria uma atitude isenta. Todavia, essa é - conscientemente ou não - a atitude de cada Testemunha de Jeová. Isso nada mais é do que um reflexo da submissão delas à Sociedade Torre de Vigia quando esta afirma receber "orientação" e "direção" da parte de Deus:

"A organização visível de Deus hoje também recebe orientação e direção teocráticas. Na sede das Testemunhas de Jeová, em Brooklyn, Nova Iorque, existe um corpo governante de anciãos cristãos... que dão a necessária supervisão.."

- Poderá Viver Para Sempre... , 1982, p. 30 (em inglês)

Com respeito a sua cronologia, ela disse:

"Esta cronologia não é de homem algum, mas de Deus.'

- A Sentinela de 15/7/1922, p. 217 (em inglês)

A Sociedade Torre de Vigia também afirma, referindo-se a si própria:

"Ela é a única para qual a Palavra Sagrada de Deus, a Bíblia, não é um livro lacrado... a única organização na terra que compreende as 'coisas profundas de Deus'!"

- A Sentinela de 1/1/1974, p. 18 (em português)

A simples análise estatística aqui exposta é - creio - mais do que suficiente para lançar sérias dúvidas quanto às afirmações acima. Afinal, afirmar que Deus está por trás de uma cronologia com índice de acerto ao redor de zero, indubitavelmente, é lançar descrédito sobre a idéia de um Deus inerrante. É produzir escárnio sobre seu poder. Se os membros do corpo governante das Testemunhas de Jeová, de fato, recebem "orientação" divina e constituem o "único" intérprete da Bíblia, seria o caso de indagar se Deus errou ou eles mesmos erraram, se Deus os conduziu em seu caminho ou eles próprios saíram tateando. O peso das evidências obriga-nos a reconhecer que eles mesmos erraram, o que suscita perguntas perturbadoras: poderiam as Testemunhas de Jeová estar atualmente propagando mais erros? Em caso afirmativo, quem responderá pelas conseqüências deles?

Sangue, Atos 15:29 e os Cristãos

Jan Haugland


A Sociedade Torre de Vigia concorda que a lei de Moisés já não se aplica aos cristãos. No entanto, a Sociedade diz que esta regra particular sobre não comer sangue foi repetida para os cristãos no assim chamado decreto apostólico pelo concílio apostólico em Jerusalém. O argumento deles diz isto:

"Observe o que aconteceu quando, anos depois da morte de Jesus, surgiu uma questão a respeito de se quem se tornasse cristão tinha de guardar todas as leis de Israel. Isto foi discutido num concílio do corpo governante cristão, que incluía os apóstolos. Tiago, meio-irmão de Jesus, referiu-se aos escritos que continham as ordens sobre o sangue, declaradas a Noé e à nação de Israel. Seriam elas obrigatórias para os cristãos? -- Atos 15:1-21.

"Aquele concílio enviou sua decisão a todas as congregações: Os cristãos não precisavam guardar o código dado a Moisés, mas era 'necessário' que eles 'persistissem em abster-se de coisas sacrificadas a ídolos, e de sangue, e de coisas estranguladas [carne não-sangrada], e de fornicação'. (Atos 15:22-29) Os apóstolos não estavam apresentando um mero ritual ou um regulamento dietético. O decreto estabelecia normas éticas fundamentais, que os cristãos primitivos acataram. Cerca de uma década depois, eles reconheceram que ainda deveriam 'guardar-se do que é sacrificado a ídolos, bem como de sangue e da fornicação'. -- Atos 21:25." (Como Pode o Sangue Salvar a Sua Vida? (1990), p. 5)

É espantoso que esta brochura de 32 páginas trate o texto bíblico de forma tão descuidada. A Sociedade Torre de Vigia nunca forneceu uma análise cuidadosa desta passagem bíblica que é a pedra angular da sua posição sobre o sangue. Os versículos usados como textos de prova são tirados do contexto de forma desonesta.

Em praticamente todo o comentário bíblico jamais escrito sobre o livro de Atos, está cuidadosamente demonstrado quão errada é essa aplicação. Os contra-argumentos que apresentaremos agora são completamente desconhecidos para a vasta maioria das Testemunhas de Jeová. A Sociedade Torre de Vigia nunca tentou seriamente responder a estes contra-argumentos e nem sequer cita todos os textos bíblicos relevantes quando trata o assunto do sangue.
Antecedentes

Um dos problemas mais importantes na primitiva congregação cristã era o relacionamento entre gentios e cristãos. Embora a nova religião tivesse as suas origens no Judaísmo, um número significativo de membros eram não-judeus. Alguns cristãos judeus argumentaram que os gentios convertidos tinham de ser circuncidados e tinham de obedecer à Lei, vivendo assim como prosélitos judeus. Paulo, que tinha sido largamente responsável por trazer gentios para dentro da congregação cristã, discordava.

"Certos homens desceram então da Judéia e começaram a ensinar os irmãos: "A menos que sejais circuncidados, segundo o costume de Moisés, não podeis ser salvos." 2 Mas, quando havia ocorrido não pouca dissensão e disputa com eles da parte de Paulo e Barnabé, providenciaram que Paulo e Barnabé, e alguns outros deles, subissem até os apóstolos e anciãos em Jerusalém, com respeito a esta disputa." (Atos 15:1-2)

É evidente a partir de muitas passagens do Novo Testamento que os conflitos entre cristãos gentios e cristãos judeus foram longos e exaltados. Paulo e Barnabé estavam entre aqueles que argumentavam que não era necessário obedecer à Tora. Contra eles estavam "certos homens" da Judéia, provavelmente de Jerusalém, que tinham vindo a Antioquia para se certificarem de que Paulo ensinava os novos convertidos segundo a tradição de Moisés.

Não havia outra razão para ir a Jerusalém exceto o fato de "certos homens" terem vindo desse lugar. A "congregação mãe" em Jerusalém naturalmente gozava de um certo estatuto, e é provável que os homens judeus tivessem invocado a autoridade dos apóstolos, dando assim a impressão de que o ensino controverso vinha dos próprios apóstolos (veja Atos 15:24). Consequentemente, para encontrar a origem da mensagem controversa e para descobrir se este era mesmo o ensino dos apóstolos, a congregação de Antioquia enviou Paulo e Barnabé a Jerusalém.

Uma vez chegados ali, eles foram calorosamente recebidos, mas também houve oposição:

"Contudo, alguns dos da seita dos fariseus, que haviam crido, levantaram-se dos seus assentos e disseram: "É necessário circuncidá-los e adverti-los que observem a lei de Moisés."" (Atos 15:5)

Porém, estes homens ficaram sem apoio no debate, a julgar pelo curto sumário do concílio que encontramos no livro de Atos. Pedro afirmou enfaticamente:

"Ao contrário, confiamos em ser salvos por intermédio da benignidade imerecida do Senhor Jesus, do mesmo modo como também essas pessoas." (Atos 15:11)

A benignidade imerecida, ou graça, e não obras de qualquer tipo, era a base para a salvação. Depois de ouvir os relatórios de Paulo e Barnabé sobre as maravilhas que o espírito realizara entre os gentios, Tiago deu o impressionante discurso que iria dar por terminado este "concílio apostólico".
A decisão

A tensão entre cristãos judeus e cristãos gentios era um problema que precisava de solução. Tal como Paulo e Pedro, Tiago afirmou enfaticamente que não se devia exigir dos gentios que obedecessem à Tora. Porém, para diminuir as tensões, Tiago disse:

"Por isso, a minha decisão é não afligir a esses das nações, que se voltam para Deus, 20 mas escrever-lhes que se abstenham das coisas poluídas por ídolos, e da fornicação, e do estrangulado, e do sangue." (Atos 15:19-20)

A Sociedade Torre de Vigia alega que estas regulações eram eternas e vinculativas para toda a humanidade, e consequentemente eram uma exigência para que todos os cristãos se abstivessem de sangue. Mas o texto não diz isso. O que é discutido não é o conjunto mínimo de princípios a que um cristão tem de obedecer, visto que há vários de tais princípios que não estão incluídos aqui, como por exemplo não mentir, não matar, etc. Por que é que Tiago só menciona estas quatro coisas? A chave é dada por Tiago no versículo seguinte:

"Pois, desde os tempos antigos, Moisés tem tido em cidade após cidade os que o pregam, porque ele está sendo lido em voz alta nas sinagogas, cada sábado." (Atos 15:21)

Sim, a razão para esta recomendação é que Moisés é lido em voz alta cada sábado. Note que a palavra "Pois" é uma continuação direta das palavras anteriores. Como é que a leitura de Moisés pode ser uma causa direta para se escrever aos gentios que se abstenham de sangue?

A resposta pode ser encontrada examinando quais são as quatro coisas enumeradas aqui. Recordemos o resumo dos regulamentos de Levítico 17:1 a 18:27. Estas eram algumas partes específicas da lei dietética, nomeadamente, eram aquelas partes que também se aplicavam aos estrangeiros vivendo em Israel. As regras que Tiago pediu que os cristãos gentios aceitassem eram exatamente as mesmas regras que um estrangeiro vivendo em Israel tinha de aceitar. Ele tinha de se abster de ofertas de alimento aos ídolos, de comer sangue e animais estrangulados (evidentemente incluindo aqueles que tinham morrido por si mesmos), e tinha de respeitar as leis relativas ao sexo, que iam muito para além da definição de "fornicação" que um gentio conhecia.

As quatro coisas que Tiago enumerou são os mesmos regulamentos que encontramos em Levítico 17 e 18, e até são enumerados pela mesma ordem.

É sobre isto que a Sociedade Torre de Vigia não quer que os seus seguidores pensem. As palavras em Atos 15:21 "Pois, desde os tempos antigos...", não têm significado rigorosamente nenhum se estas são leis absolutas e universais de Deus para a humanidade. Como é que a leitura da lei de Moisés em sinagogas judaicas podia ser uma razão para gentios aderirem a leis universais? Ao contrário, faz todo o sentido quando compreendemos que estas eram as leis mínimas a que um cristão gentio tinha de obedecer para ser de algum modo aceite numa comunidade judaica.

Nas partes orientais do Império Romano, fora da Palestina, cerca de 15 a 20% da população era constituída por judeus. Normalmente os judeus e os gentios não se associavam uns com os outros (veja Gálatas 2:11-14). No entanto, se os cristãos gentios aceitassem estes regulamentos estabelecidos para estrangeiros vivendo em Israel, seria socialmente mais aceitável para os cristãos judeus associar-se com eles. Esta condição para a associação era bem conhecida, não só para os judeus, mas também para gentios. Tiago referiu-se a este fato quando resumiu rapidamente a lei em Levítico 17:1 a 18:27 com as palavras "que se abstenham das coisas poluídas por ídolos, e da fornicação, e do estrangulado, e do sangue".

Esta é a explicação que reúne o acordo da vasta maioria dos peritos:

"O motivo para emitir o Decreto Apostólico, deve notar-se, foi resolver a questão de saber se devia exigir-se que os gentios convertidos ao cristianismo se submetessem ao ritual da circuncisão e cumprissem os outros estatutos mosaicos. O Concílio decidiu que tal observância não era requerida para a salvação; contudo, ao mesmo tempo, com o objetivo de evitar ofender desnecessariamente os cristãos judeus (e judeus que consideravam a hipótese de tornar-se cristãos), o Concílio pediu aos gentios convertidos que fizessem certas concessões por razões de prudência, abstendo-se daqueles atos que ofenderiam os escrúpulos judeus e que impediriam o convívio social [entre gentios e judeus], incluindo a participação em comum na Ceia do Senhor."1

"Continuava a haver, porém, um problema prático. Na maioria das igrejas os crentes gentios tinham de viver lado a lado com crentes judeus, que tinham sido educados na observância de várias leis alimentares e a evitar tanto quanto possível o convívio social com gentios. Embora já não fosse necessário requerer aos gentios que se submetessem à lei cerimonial, eles fariam bem em comportar-se de um modo que mostrasse consideração para com os seus "irmãos mais fracos" de nascimento judeu, pois não se podia esperar que todos estes adquirissem uma perspectiva tão emancipada em relação às leis alimentares como Pedro e Paulo. Portanto, sem comprometer a liberdade cristã dos gentios, Tiago apresentou a sua opinião considerada de que devia pedir-se-lhes que respeitassem os escrúpulos dos seus irmãos judeus, evitando carne que tinha associações idólatras ou que não tivesse sido devidamente sangrada, e por conformarem-se ao alto código judeu de relações entre os sexos em vez de continuarem contentes com os padrões pagãos mais baixos a que tinham sido habituados. Isto suavizaria o caminho da associação social e à mesa [das refeições] entre os cristãos de nascimento judeu e gentio."2

"[Versículo] 20. mas devemos instruí-los: A ligação adversativa disto a "afligir" (v. 19), e a recapitulação dos versículos 10-11 no versículo 19, demonstram que o 'decreto' é uma concessão em vez de uma imposição, tornando possível a vida e as refeições em comum sem lançar qualquer ônus sobre os recém-chegados. As quatro condições (também no versículo 28; 21:25) parecem ser quatro das coisas proscritas em Levítico 17-18 para estrangeiros residindo em Israel: carne oferecida a ídolos, comer sangue e comer animais estrangulados (não mortos segundo o ritual), e relações sexuais com parentes próximos".3

Esta interpretação também é apoiada por vários outros versículos da Bíblia que a Sociedade Torre de Vigia se vê obrigada a explicar de forma diferente. Examinemos em primeiro lugar a conclusão do concílio. Eis os versículos tão bem conhecidos, e tão pouco compreendidos, pelas Testemunhas de Jeová:

"Mandamos, portanto, Judas e Silas, para que eles também possam relatar as mesmas coisas por palavra. 28 Pois, pareceu bem ao espírito santo e a nós mesmos não vos acrescentar nenhum fardo adicional, exceto as seguintes coisas necessárias: 29 de persistirdes em abster-vos de coisas sacrificadas a ídolos, e de sangue, e de coisas estranguladas, e de fornicação. Se vos guardardes cuidadosamente destas coisas, prosperareis. Boa saúde para vós!" (Atos 15:27-29)

As Testemunhas de Jeová geralmente interpretam isto como uma ordem para se abster de, entre outras coisas, sangue. Porém, tal como várias fontes acima citadas notaram, o texto não é uma ordem. O bem conhecido comentarista bíblico F. F. Bruce diz:

"Embora o grego do N[ovo] T[estamento] seja bem fornecido de verbos de ordem, é digno de nota, conforme F. J. A. Hort frisou, que nenhum deles seja usado aqui."4

Mesmo que este texto se aplicasse a cristãos que vivem hoje, as próprias palavras testificam que definitivamente não é uma ordem. Bruce também cita Hort como tendo dito que o texto é "uma forte expressão de opinião, mais do que conselho e menos do que uma ordem."5 A partir daqui, compreendemos que quando o concílio disse "estas coisas necessárias", referia-se a coisas necessárias para evitar conflito entre cristãos judeus e gentios, que era o motivo da toda a controvérsia desde o início.

Vários outros versículos bíblicos apoiam esta conclusão:
Atos 21 -- "Todos eles são zelosos da Lei"

A fricção entre cristãos judeus e gentios não terminou com o assim chamado decreto do Concílio Apostólico de Atos capítulo 15. Antes pelo contrário, quando Paulo voltou a Jerusalém algum tempo depois ele viu-se metido no meio da mesma discussão. Tiago disse-lhe:

"Observas, irmão, quantos milhares de crentes há entre os judeus; e todos eles são zelosos da Lei. 21 Mas eles ouviram rumores a respeito de ti, de que tens ensinado a todos os judeus entre as nações uma apostasia contra Moisés, dizendo-lhes que não circuncidem os seus filhos nem andem nos costumes [solenes]. 22 O que se há de fazer, então, a respeito disso?" (Atos 21:20-22)

Obviamente, embora Tiago e toda a congregação em Jerusalém já tivessem decidido que isto estava de fato correto, muitos tinham dificuldade em engolir isso, especialmente os judeus de conversão mais recente. Com efeito, já era suficientemente grave que os gentios não fossem obrigados a seguir a Tora, mas a conclusão óbvia de que os cristãos judeus também não precisavam de a seguir era tão controversa que Tiago nem sequer se atreveu a levantá-la. Antes pelo contrário, Tiago delineou duas linhas de ação para acabar com os assim chamados rumores de que Paulo estava a falar contra Moisés: Paulo devia realizar um ritual judaico bem conhecido, a purificação cerimonial, junto com quatro homens cristãos judeus muito obedientes à Lei. Isto daria a todos os judeus a impressão de que os rumores eram falsos e que Paulo estava 'guardando também a Lei'.

Tiago e os outros, conforme vimos, já tinham enviado uma carta instruindo os cristãos gentios a não ofenderem os judeus:

"Quanto aos crentes dentre as nações, já avisamos, dando a nossa decisão, de que se guardem do que é sacrificado a ídolos, bem como do sangue e do estrangulado, e da fornicação." (Atos 21:25)

Estas duas linhas de ação foram levadas a cabo para evitar ofender os cristãos judeus. O contexto e a mensagem de ambas as ocorrências da lei contra o sangue no Novo Testamento (Atos 15 e 21) é que esta lei era unicamente para evitar fazer tropeçar os irmãos judeus. Esta não era uma lei universal para todos os homens, era unicamente uma questão de respeito pelas consciências dos cristãos judeus.
1 Coríntios 8 -- Carne oferecida a ídolos

Paulo trata da questão de fazer outros tropeçar versus liberdade na sua primeira carta aos Coríntios. O assunto que foi tratado em Jerusalém e que discutimos acima, é tratado diretamente por Paulo nesta carta. Aqui, ele confirma diretamente que a regra sobre abster-se de ofertas a ídolos (e isto tem naturalmente de se aplicar de forma igual ao sangue) não era uma lei universal, era antes uma recomendação feita para evitar que outros tropeçassem:

"Agora, acerca dos alimentos oferecidos a ídolos: sabemos que todos nós temos conhecimento. [...] 4 Ora, acerca de comer alimentos oferecidos a ídolos, sabemos que o ídolo nada é no mundo, e que não há Deus senão um só. [...] 7 Não obstante, nem em todos há tal conhecimento; mas alguns, acostumados até agora com o ídolo, comem o alimento como algo sacrificado a um ídolo, e a consciência deles, sendo fraca, fica poluída." (1 Coríntios 8:1, 4, 7)

Isto coloca um problema significativo à interpretação da Sociedade Torre de Vigia sobre Atos 15. A solução óbvia, que a interpretação da Sociedade Torre de Vigia está errada, é evidentemente inaceitável para eles. Se admitissem que a interpretação está errada, podiam perder muito prestígio, e foi derramado tanto sangue literal ao ser seguida a proibição do sangue que esta tem de ser defendida a todo o custo. A Sentinela de 1.º de abril de 1979, pp. 31-32, tenta responder a isto numa coluna de "Perguntas dos Leitores":

"Será que o apóstolo Paulo discordou do corpo governante do primeiro século na questão de comer carne oferecida aos ídolos, conforme alguns concluem em vista da comparação de Atos 15:28, 29, com 1 Coríntios, capítulo 8?"

O modo como a pergunta está redigida pressupõe uma interpretação de Atos 15 para a qual não há apoio no próprio texto. É óbvio que a Sociedade Torre de Vigia não se quer arriscar a fazer a pergunta correta nas suas revistas, pois isso poderia levar algumas Testemunhas a pensar com clareza. De modo que a Sociedade Torre de Vigia toma a sua interpretação de Atos 15 como um dado adquirido, e constrói uma possível auto-contradição na Bíblia. Assim o leitor terá a sua atenção focada na resolução da aparente contradição, e vemos que a Sociedade Torre de Vigia afasta cuidadosamente a atenção de toda e qualquer idéia que pudesse sugerir que a solução [da contradição] está na interpretação errada da Sociedade Torre de Vigia quanto à situação que estava por detrás do concílio apostólico, e não na interpretação das palavras "carne oferecida a ídolos".

E no entanto, é esta última a explicação que a revista apresenta. A pergunta correta não é feita na revista, por medo de dizer às Testemunhas de Jeová que este argumento existe, mas ainda assim a Sociedade Torre de Vigia tenta lidar com o argumento neste artigo, que declara:

"O que o decreto em Atos 15:28, 29, proibia era o cristão participar numa cerimônia formal, religiosa, ou cometer um ato de idolatria. Os que sacrificavam um animal ao ídolo obtinham parte da carne para comer. Fazerem isso era claramente um ato religioso; era considerado como participando numa refeição com o deus pagão. (Êxo. 34:15; Deu. 32:17; 1 Cor. 10:18-21) Os cristãos absolutamente não podiam fazer isso. O decreto do corpo governante cristão havia proibido isso, e Paulo estava de pleno acordo. Escreveu: "Portanto, meus amados, fugi da idolatria." -- 1 Cor. 10:14; 1 Tes. 1:9." (A Sentinela, 1.º de abril de 1979, pp. 31-32)

Isto não é uma resposta, é uma contradição direta do que o texto da Bíblia diz! Atos 15:29 e 1 Coríntios 8:4 usam exatamente a mesma palavra grega. Em ambos os textos a palavra é eudolóthutos, conforme se pode confirmar consultando a Kingdom Interlinear Translation [Tradução Interlinear do Reino] da Sociedade Torre de Vigia. No entanto, a Tradução do Novo Mundo, que afirma ser uma tradução literal, diz "coisas sacrificadas a ídolos" em Atos 15:29 e "alimentos oferecidos a ídolos" em 1 Coríntios 8:4, não havendo qualquer outra razão [para traduzir a mesma palavra (eudolóthutos) de modo diferente nos dois textos] que não seja esconder as similaridades.

Não existe evidência absolutamente nenhuma de que o decreto apostólico fosse sobre "participar numa cerimônia formal, religiosa, ou cometer um ato de idolatria". Conforme vimos, Paulo usa exatamente a mesma expressão que Lucas usou em Atos 15:29. Não há nada no contexto, ou na expressão, que indique que Atos se refere a qualquer outra prática além de comer carne oferecida a ídolos. Embora Atos 15:20 use uma expressão diferente (a Tradução do Novo Mundo diz "coisas poluídas por ídolos"), isto não dá apoio nenhum à Sociedade Torre de Vigia. A carta final e a expressão oral que Tiago usou tinham de significar exatamente a mesma coisa, caso contrário a carta não seria entendida corretamente. Não há evidência de que esta expressão se referia a outra coisa que não fosse pura e simplesmente "carne oferecida a ídolos", e vimos isto confirmado em Atos 21.

Estes dois textos juntos provam que o texto em Atos 15:28, 29 não é um mandamento universal. Era uma forte recomendação para os cristãos gentios seguirem certas regras da Tora para evitar fazer tropeçar os seus irmãos judeus. Paulo confirma isto, e apoia a mesma recomendação, mas também declara que desde que não se faça tropeçar um irmão, é perfeitamente aceitável comer este alimento.

Finalmente, aqueles que hoje insistem em argumentar sobre leis dietéticas fariam bem em acatar o seguinte aviso do próprio Jesus Cristo:

"Não há nada de fora dum homem passando para dentro dele que possa aviltá-lo; mas as coisas que procedem do homem são as que aviltam o homem. [...] 21 pois, de dentro, dos corações dos homens, saem raciocínios prejudiciais". (Marcos 7:15, 21)

Notas

1 Bruce M. Metzger, A Textual Commentary on the Greek New Testament, (Londres: United Bible Societies, 1971-1975), p. 430.

2 F. F. Bruce, Commentary on the Book of the Acts, (Grand Rapids, Mi: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1962), p. 311.

3 Richard J. Dillon, The New Jerome Biblical Commentary, (Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall, 1990), p. 752.

4 F. F. Bruce, Commentary on the Book of the Acts, (Grand Rapids, Mi: Wm. B. Eerdmans Publishing Co., 1962), p. 315.

5 F. F. Bruce, The Acts of the Apostles, 1990, p. 346.